agosto 27, 2010

A guerra é uma merda

Antes de abrir fogo contra instituições multilaterais, pergunte-se antes de que lado você está.

Uma das desvantagens da área de comunicação é nunca se especializar efetivamente em nada. O comunicador é um 'expert' em generalidades. A área, no entanto, é uma das que estuda o espetacular e interessante efeito dos símbolos e mensagens gerados cotidianamente.

Ainda me impressiona o fato de que a sociedade contemporânea, mesmo tendo um acesso brutalmente maior à educação, esteja pouco a pouco sendo dominada pelas imagens. E por 'imagens' quero dizer este conjunto de símbolos e mensagens que grosseiramente identifico.

Entre leigos e, também, no jornalismo internacional, tenho ouvido com uma frequência maior do que a desejável que entidades como a Organização das Nações Unidas (ONU) ou outras comunidades regionais multilaterais “faliram”. Motivo apresentado constantemente: o Conselho de Segurança não impediu as invasões do Iraque e do Afeganistão.

A partir desses “fatos”, decretam o fim das Nações Unidas, em um mundo cada vez mais financeirizado e “sem fronteiras”. A própria União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) foi desqualificada por um “destacado” comentarista internacional na semana passada, na mediação do impasse diplomático entre a Venezuela e a Colômbia. Motivo: “Não tem força”.

Fico imaginando como é possível, ainda, que este tipo de discurso seja tomado como “progressista”, já que seria uma espécie de “denúncia” contra as nações que não desejam o diálogo e decidem agir sem levar minimamente em consideração o multilateralismo e a voz dos povos em todo o mundo.

É o caso do Iraque, em que de modo inédito povos do mundo inteiro se reuniram antes de uma invasão – que muitos ainda chamam equivocadamente de “guerra” – sequer começar, em protesto à ação bélica liderada pelos EUA e pela Inglaterra. Igualmente sem qualquer tipo de apoio das Nações Unidas – com franca oposição mesmo no conservador Conselho de Segurança –, os países que formam a frágil 'coalizão' que desejava a invasão (porém com grande potencial bélico) decidiram abandonar todos os apelos internacionais e se atiraram num precipício. O resultado nós conhecemos. Evidentemente que os ideólogos do belicismo pós-moderno estão todos vivos. Não são eles que seguem para o front. Nada diferente em relação ao Afeganistão, dois anos antes.

Pois bem. Diante desta situação específica, estamos diante de duas posições bem claras. As relações internacionais são compostas por um complexo jogo social, político, econômico e cultural, porém falemos desta situação. Bem específica.

1. A primeira posição – mais representativa, em termos globais – diz que o único caminho é o diálogo. A guerra só pode ser justificada por um motivo absolutamente explícito de autodefesa. Claramente, conforme apontaram todos os relatórios da ONU, não era esse o caso nem do Afeganistão nem do Iraque. Isto não estava em questão. As supostas 'ameaças' existentes nestes países do Oriente Médio foram amplamente desconstruídas, desde o início, inclusive por experientes jornalistas.

2. Temos, do outro lado, a posição daqueles que querem a guerra. Que “adoram a guerra”, como chegou a confidenciar o ex-presidente dos EUA George W. Bush. Ele tinha a oposição de todos os povos do mundo. Da gigantesca comunidade árabe. Da maioria do povo de Israel. De toda a América Latina, África e Caribe. Até mesmo de governos poderosos, como França, Rússia e China, que vetaram no Conselho de Segurança a legalidade da invasão.

Em vão, pois no final da linha não há quem possa impedir o uso da força por aqueles que a detém – um método medieval de dominar uma determinada região que sempre “deu certo” para aqueles que não se importam em cometer crimes contra a Humanidade, conforme documentou amplamente o escritor Noam Chomsky.

Pois chegamos ao ponto desejado. Somos pequenos – sociedade civil, ONGs, movimentos sociais – porém muitos. E quando nos perguntam: o que você acha da UNASUL, das Nações Unidas? Curiosamente – a ciência da comunicação há de estudar este fenômeno! – corroboram a posição bélica: o multilateralismo faliu. Não existe mais. As Nações Unidas estão acabando.

São milhões e milhões de pessoas em todo o mundo – destacadamente na África e sul da Ásia, principalmente, mas também no Caribe, no leste europeu – que precisam do multilateralismo. Lugares onde urge o diálogo entre grupos em guerra, entre milícias de libertação nacional, entre governos e rebeldes. Milhões e milhões de povos que gostariam de ver a paz consolidada. Lugares onde centenas de trabalhadores humanitários perdem seu tempo, sua saúde e até mesmo suas vidas pelo diálogo. Onde são justamente funcionários da ONU que têm a atribuição de realizar a conversa intergovernos, intergrupos da sociedade, para tentar solucionar impasses que já duram décadas, até mesmo séculos.

Mas não. Para alguns, o diálogo morreu. A ONU faliu. Uma posição cômoda, claro, para um sociólogo ou um jornalista que mora em um país cuja situação política está estabilizada. Mas não para os moradores da fronteira do Chade com a República Centro-Africana. Certamente não para os nobres moradores de Darfur. Ou ainda para as mulheres que vivem em áreas remotas da República Democrática do Congo. E o que diriam os povos do Haiti e da Somália? De Guiné-Bissau ou na Palestina?

Estes desejam o diálogo. A paz com participação ativa. Buscam direitos, alimentos, dignidade. E não se enganem: são justamente os governos que negam o multilateralismo – por meio do boicote político a tratados e convenções – os mesmos que negam os direitos fundamentais de um povo e praticam os piores crimes contra a Humanidade. Entre países poderosos e pequenas ditaduras, estão todos no mesmo barco. Não foi à toa que a primeira grande medida de Adolf Hitler, ainda em 1933, foi se retirar da Liga das Nações.

O Itamaraty, atualmente chefiado pelo ministro Celso Amorim, possui uma posição clara, simples, direta: guerra, não. Se o Irã tem um problema, conversaremos. Se não há liberdade política na China ou na Coreia do Norte, mais diálogo. Se isso prejudicará a posição do Brasil diante dos EUA, dane-se: mais vale o diálogo. Até mesmo a acusação ríspida a países que desrespeitam grosseiramente os direitos humanos, como ocorre frequentemente por parte da chancelaria brasileira, é nestes termos: vocês não estão respeitando as convenções, o coletivo.

Felizmente se foi o século XX. Ficou, claro, um resquício: os generais e suas estrelas, se vangloriando por seu passado vergonhoso de extermínio da oposição. Os atuais assassinatos em massa no Oriente Médio, na África e nas Américas, agora observados mais de perto: resquícios. Na TV, muito ainda da cultura da violência, que promove como herói o forasteiro que mata todos os seus inimigos e vence o “mal”. Felizmente, está chegando ao poder uma nova geração.

A paz é o objetivo – desarmamento, multilateralismo, multiculturalismo, diálogo global por meio das redes, entendimento mútuo entre diferentes, estas são palavras em ascensão. A guerra, uma aberração que ninguém deseja, nem mesmo em forma de brinquedo ou produto audiovisual. Basta pegar os registros do século passada para evidenciar o fracasso do ideário bélico entre os mais jovens – apesar da persistência de parte da indústria cultural.

Se esse novo ideário, humanista, vai persistir por mais uma geração, eu não sei. Só sei que não compartilho o ideário belicista e, portanto, não o divulgo. E você?

junho 05, 2010

Paz, economia e utopia

Foto: www.cntu.org.brEm um recente texto no sítio Fazendo Media, em que comento sobre a posição soberana que o Brasil tem tido nos últimos anos diante dos Estados Unidos, o leitor Mauro Toshiuki fez uma importante observação [disponível aqui], que reproduzo na íntegra:

“Boa Noite a Todos, caro senhor Herivelto Quaresma lhe pergunto e lhe proponho um tema. Qual o interesse americano na paz mundial se o seu orçamento militar é maior que o PIB da maioria dos países do mundo e o fim desses gastos significariam um transtorno gigantesco às regiões onde se encontram as fábricas de armas americanas e um grande número de demissões.”

“Nunca se escreveu sobre os interesses dos fabricantes de armas na manutenção dos gastos e o que realmente representa esse ramo de atividade para a economia americana e para os estados americanos que sediam estas fábricas. Se o Brasil gastasse centenas de bilhões de dólares com armas o mínimo indício de busca da paz seria o suficiente para que os governadores e prefeitos corressem para lembrar o presidente sobre o problema do desemprego e da recessão. Acho que a paz levaria os EUA à recessão.”

Tema urgente e necessário, é pouco comentado – de fato – na imprensa como um todo, porém comum nos debates mais vinculados à área da economia e mesmo em questões relacionadas aos direitos humanos. O próprio cineasta norte-americano Michael Moore filmou o caso de uma cidade – me foge se canadense ou estadunidense – em que praticamente toda a economia local girava em torno de uma única empresa da indústria bélica.

Neste caso, a primeira questão já está colocada: acabar com tal arranjo produtivo – um exemplo: aumento vertiginoso dos impostos, tal como costumam fazer com os bingos ou o cigarro – seria trágico, a curto e médio prazo, para dezenas ou até mesmo centenas de famílias.

A segunda questão, a mais complexa, é justamente a forma como essa mudança gradual da economia poderia ser efetivada. Aqui cabe uma pequena síntese, talvez insuficiente porém necessária, do que estamos a falar: a economia.

Relembrando uma teoria básica

Em todo arranjo produtivo – e, neste caso específico, um arranjo produtivo local –, não podemos deixar de lado a velha questão da mais-valia. Citando:

“Quando o capitalista considera a mercadoria fabricada, não pode aí reconhecer a diferença entre o capital constante (meios de produção) e o capital variável (salários). Sem dúvida, ele sabe que sobre seus gastos (o preço de custo da mercadoria) uma parte é despendida em meios de produção e outra parte em salários, e que será preciso, para a produção contínua, repartir o mesmo dinheiro proveniente da venda da mercadoria, para comprar, por um lado, meios de produção e, por outro, força de trabalho.”

“Mas sobre a produção do valor e da mais-valia, isto não lhe diz nada. O que ele vê é unicamente que, no preço de custo da mercadoria, retorna exatamente o valor da mercadoria, tal como ele já existia antes do início da produção, e que o próprio salário retorna tal como ele existia antes do início da produção. A diferença característica entre o capital constante e o capital variável está, pois, encoberta pelas aparências, e a mais-valia obtida no fim da produção parece provir uniformemente de todas as partes do capital”. (Karl Marx. O Capital. RJ: Zahar Editores, 1982, edição de Julian Borchardt).

O que Marx argumentará com extrema precisão é que, ao contrário, a diferença entre o capital fixo (prédio, máquinas etc.) e o capital circulante (matérias-primas, matérias auxiliares e os salários) salta aos olhos. Para mais detalhes, vide o capítulo 6 da referida obra.

Bom, este foi apenas um parêntesis para lembrarmos o seguinte tópico.

É verdade que uma determinada economia poderá estar histórica e dramaticamente vinculada a um setor indesejável – supondo que poderiam existir governantes que supostamente desejem diminuir o orçamento militar de seus países. No entanto, a experiência de mudança do arranjo produtivo citado não poderia ter um lugar melhor para acontecer.

O Estado forte é uma realidade

Os Estados Unidos tem uma das economias mais fortes do planeta e, portanto, como sabem os economistas desenvolvimentistas e tentam esconder os neoliberais, um Estado muito forte. Ele é capaz, inclusive, de ajudar financeiramente, de forma espantosa, os gigantes bancos deste país – a autoproclamada “iniciativa privada”.

Este Estado, forte e robusto, tem duas ações fundamentais que poderiam minar o problema do desemprego, neste rearranjo:

1. Utilizar a mais-valia, sua espantosa arrecadação anual que forma a mais rica economia do mundo, para investir em outros setores e fazer, portanto, a substituição gradual da produção.

2. Reformar as agências, de modo que passem a ampliar as “áreas estratégicas” de investimento e incluir, por exemplo, a produção em energia limpa ou as tecnologias limpas de produção de alimentos em áreas rurais.

Estas são observações pontuais, limitadas. No entanto, permitam-me argumentar que são centrais para o direcionamento do tema que o Sr. Toshiuki nos traz.

Dois são os principais obstáculos frequentemente observados:

1. No meio disso tudo, conforme frequentemente esquecem os próprios economistas neoliberais, estão as pessoas. Centenas de milhares de pessoas passaram décadas de suas vidas se dedicando a um determinado ramo da economia, com grande afinco por vezes, e é nele que estão inseridos. Isso traz uma dificuldade muito grande, pois uma mudança econômica estrutural demandaria também uma força social suficientemente grande para criar a própria demanda pelo rearranjo produtivo. É o caso da indústria do tabaco, dos anos 90 para cá.

2. The political will, como dizem por lá, ou seja, a vontade política. As nossas frágeis nações conseguem, por meio de processos ditos “democráticos”, aprovar medidas que passam longe das aspirações da opinião pública – que, como vimos na guerra do Iraque, também poderá ser manipulada para um determinado desejo. Os governos podem tudo, principalmente os mais consolidados.

Um mundo financeirizado e desumanizadoEm geral, há no mundo muita gente exigindo melhores salários, melhores condições de trabalho, pleno emprego etc. Pouquíssimas pessoas, no entanto, fazem como uma de suas verdadeiras reivindicações um futuro melhor para o mundo.

O que é, afinal, uma verdadeira reivindicação?

Eu tenho um emprego X, com uma remuneração Y e direitos observados na lei trabalhista. Uma vez negligenciados, o trabalhador irá imediatamente reivindicar a reparação, seja ela financeira ou moral. A sociedade capitalista criou, mal ou bem – e principalmente nos países mais consolidados – diversos mecanismos para tratar desta questão. O Judiciário, a Imprensa e os Sindicatos são apenas três exemplos.

Mas quanto às questões mais amplas? Uma empresa norte-americana de petróleo já provocou, desde o dia 20 de abril, o vazamento de cerca de 71,9 milhões de litros de óleo no Golfo do México, ameaçando o ecossistema local, regional e até global, a longo prazo. Sem querer parecer simplista, permitam-me pensar de modo mais amplo. O sistema judiciário estadunidense, se for extremamente eficiente, conseguirá retirar milhões e milhões de dólares da British Petroleum, numa tentativa de “reparar” os danos ao meio ambiente e às pessoas que vivem na região. Nem sequer é o que está acontecendo, mas vamos pensar nisso como uma hipótese.

Nenhum “juiz”, no entanto, tem a prerrogativa de determinar o fracasso do sistema energético baseado em matérias-primas danosas ao meio ambiente. E as nossas “democracias” tão pouco dão voz aos “radicais” que buscam, a partir desta perspectiva mais visionária, eliminar de uma vez por todas as práticas genocidas, em termos ambientais, de geração de energia. É esta energia que mantem um país se “desenvolvendo” e “crescendo” de modo “sustentável” (ou seja, sustentando o crescimento).

Precisamos identificar frequentemente as falhas estruturais de um sistema que pensa a vida em termos financeiros para sermos, como argumentou Gandhi, a mudança que desejamos ver no mundo.

Podemos pegar um caso exemplar, para não soar “utópico”, como é comum ouvir nos corredores diplomáticos. O Movimento Libertem Gaza, responsável pela frota de pequenas embarcações que rumavam a Gaza para levar ajuda humanitária, é um grupo modesto, porém decidido a fazer valer a vontade da verdadeira “comunidade internacional”.

Israel vê crescer o ódio ao país por um motivo muito simples: a “democracia” que lá se encontra resultou na manutenção, há décadas e até hoje, de líderes de extrema-direita, que efetivamente acreditam que o povo palestino é um povo menor, que não foi “escolhido” e que, por isso, não merece a “Terra Santa”. Evidentemente que o mundo em coro, em pleno século XXI, repudia tal assertiva, que é confirmada não por palavras, mas pelas ações contínuas de terrorismo promovidas pelo Estado sionista.

No entanto, o “mundo” possui representantes que, na hora H, entram para a turma do “Deixa disso”, como se diz na linguagem popular. Contra nações mais frágeis, sanções econômicas variadas e até mesmo guerras. Para as nações mais potentes, o “bom senso” da diplomacia, o “diálogo”. Um peso, duas medidas.

Este Movimento fez, portanto, o que ninguém ousou fazer (apesar de pedirem, “diplomaticamente”): mesmo pequenos, desarmados e agindo sem o aparato naval adequado, romperam o bloqueio imposto por Israel – lembrando que esta não é a primeira vez que eles conseguem furar os bloqueios. Desta vez, foram nove mortos ou mais. A embarcação chegou e a ajuda humanitária foi entregue.

Aqui, portanto, nada de novo. Se existem pessoas que verdadeiramente enfrentam o sistema estabelecido por governantes insensíveis aos apelos populares, devem saber também que poderão ter problemas graves. Em todo o mundo, centenas de milhares de pessoas lutam para que esta situação específica – se você luta por justiça social, poderá pagar com a própria vida – mude. Mas o risco é real.

Por que fazê-lo, então? Esta é uma grande questão humana.

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(*) Herivelto Quaresma é jornalista e blogueiro carioca. Conheça seu blog clicando aqui ou o acompanhe pelo twitter.com/heri_quaresma

junho 01, 2010

Neonazistas: por omissão, ignorância ou ideologia

“A política genocida do estado judeu com relação aos palestinos é equivalente à que foi praticada contra os judeus durante o regime nazista. Não aprenderam nada, a não ser a repetição das crueldades a que foram submetidos. E a ‘ordem internacional’, dominada pelo grande capital, deixa acontecer.”

Com estas palavras, o escritor Rolando Lazarte, colaborador da Revista Consciência.Net, encerra o que representam os atuais mandatários do governo genocida de Israel. Praticando o conhecido e temeroso terrorismo de Estado, que o escritor Noam Chomsky há tantos anos denuncia, o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu demonstrou algo que os EUA temem... no Irã: falta de confiança. Os EUA irão propor ao Conselho de Segurança da ONU sanções a Israel, pela falta de trust building?

A saber, a imprensa internacional relatou esta segunda-feira, dia 31 de maio: em águas internacionais, as forças israelenses atacaram de surpresa o comboio de seis navios contendo ajuda humanitária, que também transportava centenas de ativistas, com mais de dez pessoas sendo mortas.

O Relator Especial das Nações Unidas sobre a situação dos Direitos Humanos no território ocupado da Palestina, Richard Falk, um veterano funcionário da ONU, declarou que “Israel é culpado por um comportamento chocante, usando armas letais contra civis desarmados a bordo de navios que se encontravam em alto mar, onde existe liberdade de navegação, de acordo com a lei dos mares”.

Junto com o Secretário-Geral e a Alta Comissária de Direitos Humanos da ONU, ele pediu uma investigação sobre o súbito ataque, observando que “é essencial que os israelenses responsáveis por este comportamento ilegal e assassino, incluindo líderes políticos que deram as ordens, sejam penalmente responsabilizados pelo seus atos equivocados”.

Um governo que não tem a maturidade para lidar com uma situação aparentemente tão simples – ativistas que se unem para romper de modo pacífico (desde quando bola de gude é arma?!?) um bloqueio que a quase totalidade dos países condenam – não tem capacidade de possuir um arsenal militar tão poderoso.

É por isso que hoje Israel – e seu maior aliado e financiador, os norte-americanos de Barack Obama – é uma das maiores ameaças do mundo para a paz mundial. Deve ser considerado um Estado terrorista, não só pelo seu potencial destruidor, como pela completa incapacidade de dialogar com o mundo.

E aqueles que apóiam tal terrorismo de Estado, de um modo ou de outro, são os mesmos que, junto com Hitler, apoiaram seu líder máximo no extermínio de minorias na Europa do século XX. São cúmplices deste Estado terrorista. Por omissão, ignorância ou ideologia. Tanto faz. O resultado é o mesmo: o nazismo reificado.

A Alta Comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, afirmou que “nada pode justificar o resultado terrível dessa operação”. Infelizmente, não é assim que pensa o último prêmio Nobel da Paz, que foi nomeado tal por causa de suas “ideias de ‘boas intenções’ para reforçar o papel da diplomacia internacional e a cooperação entre os povos”. O presidente Barack Obama – este que ganhou o prêmio máximo da “paz” – expressou, segundo nota da Casa Branca, “profunda lamentação pela perda de vidas no incidente de hoje [segunda 31] e preocupação com os feridos. O presidente também expressou a importância de conhecer todos os fatos e circunstâncias sobre o trágico evento desta manhã o mais rápido possível”. Nada de um firme repúdio ao ataque: apenas o que há de mais demagogo na diplomacia.

ALEMANHA GANHA UM PONTO COM O MUNDO

Pelo menos uma ótima notícia, nesta triste segunda-feira: o presidente alemão Horst Koehler renunciou. Para quem não ficou sabendo, Koehler – que é ex-diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) e aliado da conservadora Angela Merkel – foi eleito em 2004 e reeleito no ano passado, mas não suportou politicamente as críticas este mês, após afirmar que um país dependente das exportações como a Alemanha às vezes precisa defender seus interesses econômicos – indo à guerra, por exemplo.

Koehler, coitado, se disse “mal interpretado”. Mas a gente relembra a fraca memória dele. Em entrevista publicada dia 20/09/2002 no jornal Herald Tribune, este mesmo cidadão alemão declarou: “Uma ação militar de curta duração contra o Iraque tem um impacto menor na economia mundial e, inclusive, poderia ter um efeito positivo, ao eliminar a incerteza que paira no mercado financeiro internacional, suscitada pela atual situação”. A declaração teve repercussão na matéria “FMI acha guerra positiva” um dia depois, no Jornal do Brasil.

Na época, a Revista Consciência.Net publicou, a respeito: “Além de reconhecimento pelo ‘bom senso’ de sempre, estes dirigentes deveriam ganhar algum tipo de prêmio neonazista de bizarrices sociológicas. Atualmente, Koehler é o presidente alemão, o que por lá não quer dizer muita coisa.” [aqui e aqui]

Portanto, nada de novo. É o mesmo Horst Koehler, um desses senhores caducos que vaga pelo mundo com muito poder e dinheiro. Poderiam perfeitamente se aposentar, prestando um grande serviço à Humanidade.

maio 28, 2010

“Se, para entrar no Conselho de Segurança, é preciso ser subserviente, é preferível não entrar”

Um Fórum global muito interessante – a Aliança de Civilizações (www.rioforum.org) – acontece no Rio de Janeiro. Não seria justo, em um texto, dar conta de todos os debates, mas gostaria de destacar alguns tópicos.

Fundamental falar da presença, sempre marcante, dos papagaios norte-americanos. O papagaio, como vocês sabem, é uma das muitas aves pertencentes à ordem dos Psitaciformes, família Psittacidae; vivem cerca de 100 anos e tem apenas 3 filhotes durante sua vida. Alguns papagaios são capazes de imitar sons e, inclusive, a fala humana. Existe toda uma variedade de papagaios. O papagaio-galego, o papagaio-de-peito-roxo, o papagaio-de-cara-roxa, o papagaio-com-aquilo-roxo e o papagaio-verdadeiro – coitado, este último em franca extinção no jornalismo.

O papagaio norte-americano, como vocês podem imaginar, é aquele que cresceu em um ambiente americanizado e repete, portanto, tudo o que vem do Norte. E eis que, durante uma coletiva de imprensa com ministros de Relações Externas de Brasil, Turquia, Espanha e Catar, surge um espécime tal qual a descrita no início deste artigo, fazendo uma “pergunta” ao ministro Celso Amorim sobre as relações entre os Estados Unidos e o país de Amorim, o Brasil.

A jornalista – que trabalha para o único jornal norte-americano sediado no Rio de Janeiro, The Globe – ouviu, antes de pedir a palavra, as mesmas perguntas de sempre da imprensa. Irã é uma ameaça, Brasil deseja entrar no Conselho de Segurança, relações bilaterais com EUA, o que vocês acham disso? Por que não concordam com os EUA??

Imagine o ministro Amorim tendo que responder, repetidamente, em cada lugar que vai, por anos e anos a fio, as mesmas perguntas de sempre – não propriamente sobre os mesmos temas, mas com o mesmo pano de fundo.

Pois eis que, não satisfeita, a jornalista do The Globe decide falar pela Secretaria de Estado do EUA, a Senhora Hillary Clinton. Como se fosse a própria, ela questiona Amorim sobre o que acha do que ela disse há um ou dois dias.

Deixe-me dizer uma coisa sobre os jornalistas brasileiros. Vou ser direto. São despreparados. Trabalham em muitos lugares ao mesmo tempo, ou com muitas tarefas em um único lugar. Não tem tempo de ler. Não tem interesse em questionar o aquário – no jornalismo, uma referência ao chefe de redação, que fica numa sala que lembra um aquário. E são, muitos e não todos, papagaios norte-americanos.

Permita-me a palavra. Em 2003, quando os Estados Unidos de George W. Bush decidiram ir à “guerra” (invasão, massacre ou genocídio seria mais adequado) contra tudo e contra todos, a chancelaria deste país resolveu defender a tese da guerra preventiva junto ao Conselho de Segurança da ONU, e apenas dois países apoiaram a ação militar. O mundo se uniu contra a guerra. Foram passeatas, manifestações, a maior declaração de “Não” à guerra de toda a História, antes de uma guerra começar. Parte da imprensa decidiu chamar este apoio à invasão do Iraque de “apoio da comunidade internacional”. E eis que, com este apoio – meio capenga, é verdade – os EUA foram à guerra. Desde então, este foi considerado o maior erro deste país em décadas, com o consequente flagelo permanente deste país e tragédias atrás de tragédias humanitárias. Sem falar no aumento do terrorismo global.

Eis que, então, surge um novo posicionamento na esfera global. Muitos países começam a construir uma visão alternativa. “Temos que eliminar todas as armas nucleares do mundo”, afirma o primeiro-ministro turco. Podemos concretizar, por meio do diálogo, mudanças significativas para abarcar toda a nossa diversidade cultural, afirmou o Secretário-Geral da ONU. O diálogo, e não a guerra, deve ser a primeira e última opção, e estamos mostrando que é possível, respondem as máximas autoridades presentes. Isso não diz respeito a esta ação específica em relação ao Irã. É uma linha de ação.

O que impressiona, ainda, é a ignorância dos jornalistas. Que estejam mal informados, ok (para isso serve a coletiva, também). Que estejam atuando de modo ideológico, tudo bem (faz parte da democracia). Mas que sejam ignorantes, não é aceitável. São jornalistas. Se estão despreparados, que fiquem calados e anotem as observações dos colegas de profissão. É uma questão de humildade.

Citam o Acordo entre Irã, Brasil e Turquia como se fosse um jogo de palavras entre autoridades iranianas e norte-americanas. Não o é. Existe um acordo. Leiam-no, por Deus!

O Acordo não fala, em momento algum, que o Irã está proibido de enriquecer urânio de modo que se configure, diante da ONU, uma ameaça. Este é um direito de toda e qualquer Nação no mundo. O que a ONU pede é transparência. Da transparência, surge a “construção da confiança” (trust building).

Os Estados Unidos, que declararam no início do encontro de um mês na ONU sobre o tema possuírem mais de 5 mil ogivas nucleares, também tem este direito. À época, o Secretário-Geral da ONU declarou que esta é uma “imagem assustadora”, durante um evento em memória das vítimas – ainda hoje – da bomba atômica no Japão. Ban afirmou, no entanto, que a revelação é um sinal de sua transparência, que por sua vez constrói confiança no país. Ninguém questionou isso. Nenhum editorial para se perguntar se isso não “atrapalharia as relações diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos”, já que o Brasil é uma Nação pacífica e que faz, inclusive, diversas mediações de paz em todo o mundo.

Mas isso a jornalista do The Globe e grande parte da “grande” mídia não levam em consideração – ainda bem que contando, sempre, com as honrosas exceções, pois do contrário estaríamos mais próximos a uma ditadura. E não levam em consideração porque os papagaios norte-americanos não pensam por si próprio, apenas repetem o que outras pessoas dizem, em volta, de acordo com o meio ambiente.

“E quanto às sanções no Conselho de Segurança, ministro Amorim?”, repetem, repetem, repetem. Os Estados Unidos, mordidos pelo fato de o plano turco-brasileiro ter dado certo, aceleraram as “discussões” neste Conselho e decidiram investir pesado no conflito – o contrário do que Brasil e Turquia fazem, que é o diálogo, o entendimento mútuo, a saída negociada. Quanto a isso, Amorim na coletiva de hoje (28/5) na Aliança de Civilizações: “Eles têm o poder quanto às sanções no Conselho de Segurança, podem fazer o que quiserem. Nós temos apenas o poder moral. Eles podem vetar o que quiserem, mas não podem impor a nós violentar a nossa consciência”.

Outra pergunta que os jornalistas costumam fazer, há pelo menos 10 anos – imaginem o tamanho da paciência requerida – é em relação à pretensão do Brasil de ser um membro permanente do Conselho de Segurança. Estas últimas ações, perguntam em uníssono, não “atrapalharia” tais pretensões?

Celso Amorim, nosso ministro: “Se, para entrar no Conselho de Segurança, é preciso ser subserviente, é preferível não entrar”.

Hillary Clinton que se conforme com sua política belicista e imperialista. Esse ministro é do Brasil e, felizmente, não é do mesmo espécime que nossos jornalistas.

NOTA DE LAMENTO

O Fórum Aliança de Civilizações estava indo muito bem, até um triste acontecimento na abertura do evento. Configurando uma das grandes forças transformadoras para a paz, a juventude compareceu ao evento e preparou recomendações, a pedido da própria Aliança. No entanto, na abertura, as recomendações foram simplesmente censuradas. "O Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon, disse que 'nós precisamos aprender com a juventude'. Como os formuladores de políticas públicas aprenderão conosco se eles se recusam a ouvir nossas vozes", afirmou uma nota assinada por jovens de diversas partes do mundo, frustrados com tal desprezo.

maio 19, 2010

Imperialismo: a gente vê por aqui

Foto: AFPMuito curiosa a cobertura de parte da mídia brasileira sobre o acordo entre Brasil, Turquia e Irã para a utilização de energia nuclear. A TV Record (17/05) foi a única a registrar: o chanceler brasileiro Celso Amorim deu entrevista após a assinatura e foi direto ao ponto:

“Dando tudo certo é uma vitória para o mundo, que demonstra que é possível resolver as coisas não da maneira como feita no caso do Iraque, mas de maneira pacífica”.

É claro que há negócios e política em jogo, ninguém duvida. No entanto, o Brasil manda o recado para os Estados Unidos: não faremos nada pela via bélica. Guerra, não. É também, portanto, uma vitória da paz, contra a estupidez das armas.

Curiosamente o Jornal Nacional, da TV Globo, não mostrou esse trecho no mesmo dia, apesar de estar ao lado do ministro Amorim, gravando. Preferiu dedicar longos minutos à posição... dos Estados Unidos. E chegou a manipular a fala do Secretário-Geral da ONU, usando apenas o trecho em que ele pede “cautela”, apesar de claramente ter classificado o acordo como “positivo” (a nota original aqui).

Na diplomacia – que é o que estes senhores e senhoras de roupas bonitas fazem, afinal – a saída primeira, prioritária e, para muitos, única, é o diálogo. A guerra é uma estupidez e está banida pelas nações mais sensíveis ao apelo popular em todo o mundo. Este é o mesmo entendimento, como não poderia ficar mais claro, da chancelaria brasileira.

Quais interesses a TV Globo defende?

Ao editar o seu telejornal a partir da fala oficial do governo dos EUA, a TV Globo confirma que busca a opção preferencial pela guerra. É uma conclusão absolutamente razoável, já que a emissora (1) ignora aqueles que defendem o diálogo e (2) manipula aqueles que o mediam.

A pressão só serve, em última instância, aos EUA, que não só deseja que os desentendimentos com o Irã continuem, como também joga um papel desagregador e belicista como forma de manter seu papel no Conselho de Segurança da ONU – único órgão das Nações Unidas que resiste a uma ampla reforma e atualização aos dias atuais – e limitar o poder das nações emergentes e menos desenvolvidas. Com o apoio da TV Globo, ao que parece.

[Acompanhe notícias sobre o acordo no Google News]

março 29, 2010

Democracia e desinformação

Fonte da foto: http://www.passandoalimpo.com/pesquisa.bmp
(Imagem: www.passandoalimpo.com)

Enquanto 76% da população acha o governo Lula bom ou ótimo (DataFolha divulgado domingo), 4% acham ruim ou péssimo.

Estes últimos devem ser todos leitores da Revista VEJA, com o perfil de uma pessoa que estava ao meu lado, hoje, numa viagem de avião que realizei a trabalho.

O jovem, com cara de novo empresário, passava pela revista olhando apenas as fotos, suas legendas e os "olhos" (no jornalismo, aqueles destaques no meio do texto, com a letra num tamanho maior). Quando tentava ler, ficava uma eternidade para conseguir acabar uma única página.

Com isso, era induzido a se informar apenas pelo que havia de mais chamativo, ao estilo VEJA. Ao relacionar estes 4% a esta determinada classe empresarial, até que faz sentido.

No entanto, é bom lembrar que as pesquisas de opinião nem sempre são confiáveis. E, além disso, nenhum governo, por melhor que tenha sido, é uma unanimidade. Sempre haverá críticas, desde as mais saudáveis até as mais desonestas.

E é exatamente porque o governo Lula entendeu o caráter da democracia, tão em falta em outros países em que já atuei como correspondente, que a aprovação parece ser efetiva.

Comentários também pelo @heri_quaresma

março 22, 2010

Coisa feia, ministro!

O ministro das Cidades, Marcio Fortes (foto), participou hoje (22) de uma conferência de imprensa durante o Fórum Mundial Urbano, ao lado da diretora do UN Habitat, Anna Tibaijuka.

Entre outras preciosidades - como incluir promessas entre os números de casas supostamente construídas para aliviar a demanda por moradia no Brasil, que passa de cinco milhões -, Fortes afirmou que o Brasil não utiliza a prática da remoção, "salvo em casos de risco de deslizamento". Isso foi dito na presença de dezenas de jornalistas do mundo inteiro.

Faltou combinar com o prefeito do Rio Eduardo Paes, também presente ao evento. Paes tem feito uma investida pesada pela remoção de diversas comunidades, inclusive sem fazer consulta aos moradores e sem negociar. Várias matérias a respeito podem ser lidas clicando aqui.

Fortes poderia ter sido mais crítico, mostrando que o Brasil admite que tem problemas e procura encará-los com senso de realidade. Preferiu ser econômico com a verdade...

março 14, 2010

Sobre os transgênicos

Original: http://projectearthblog.blogspot.com/

Fiz um comentário no site consciencia.net, num texto do jornalista Ricardo Cabral. Falo um pouco sobre o perigo de liberar os transgênicos. Leia aqui: http://www.consciencia.net/?p=4601

Clica na imagem para ampliar o cartum.

Um abraço e bom domingo a todos.